sábado, 24 de outubro de 2009

A Efêmera Infância Dessa Vida



São 4 horas da manhã;

Seu Zé Altivo e dona Nadir acordam pra trabalhar.
Nadir ficava em casa, esquenta os pães de queijo que assara e guardara no frezzer para conservar.
Fazia uma boa garrafada de café quase amargo e punha na mesa junto com o doce de leite, geleia natural de amora, frutas, biscoitos e pedaços de rapadura para começar o dia bem.
Altivo colocava o casaco já antigo, suas galochas brancas, dava uma talagada numa dose de cachaça e abre a porta...


E vê o mundo!


Meio noturno por causa da hora, avistava os vultos das asas das galinhas que acoadas tagarelas, as chocadeiras em cima da goiabeira.


Via o estampado por entre as sombras de um pé de manga sabina e de um bananal.


Um córrego cortava a divisa com seu vizinho que sempre perde no truco quando Altivo jogava tendo de parceira sua Nadir.

Tinha mandiocal

Mais manga

Mexerica

Amora

Galinha da angola

Tinha o Lipe!

Lipe era o companheiro de trabalho do seu Altivo, um cão branco, quase uma ovelha no tamanho, que sempre corria ao lado de todos nas roças, e no apartar das vacas era pastor experiente.
Descendo o trilho de terra entre o pomar, logo depois da sede avistava pés de carambola, outro de acerola e uma porteira que leva seus olhos pra frente de uma serra com uma gigante pedra branca, mas parecia uma janela cintilante quando o sol batia nela...


Uma Ponta da serra que some pelo horizonte.

Descendo mais, antes de chegar no fundo do curral tinha um chiqueiro na beirada da porteira e do outro lado uma horta. Pouco antes de tudo dito a maquina de moer cana, de onde saia rapadura e garapa bem doce e saborosa toda manhã depois do trabalho.
Anos e anos repeti essa visão das 4 horas da manhã e todo o passar do tempo.

Mas com a vida terminando, eles decidem deixar a fazenda para os filhos, o lugar de tantas felicidades e amizades do Truco com tentos de semente, com o blefe bem famoso pela região:

- Nadir, você sai com o zap, eu com o sete ouro... Vou te mandar um "treizinho" só pra não assustar o cumpadre.

Seu blefe só tinha um problema...

Seu Altivo sempre acertava.

Das crianças nos dias de final de semana correndo e se espatifando pelo pasto, com espinhos no pé e mangas na mão, mulheres habilidosas com seus temperos mineiros todos misturados como um sangue de familia, da prosa curiosa e sempre bem iventada que Altivo contava ao anoitecer, sendo a atenção desviada apenas pelos tapas que dava-mos quando as muriçocas nos picava.

E aquela fazenda de tantos pés, de tantas crianças, de tantos sonhos e brincadeiras e que eles tanto lutaram pra construir, pé por pé, foi alagada pelo mar que arranjaram pra Minas....

E faleceu na mão de quem desconheço.

O que sobrou depois?
Nadir e Altivo fora morar em outra roça onde nada tinha, apenas um capim de areia, vaca magra e uma vista triste e cega até o horizonte da rodovia.

Nadir morrera de enfarto.

Altivo de desamor.

Um comentário: